1. Introdução: o erro estrutural do Ocidente
Grande parte das análises ocidentais sobre a China foram moldadas por preconceitos ideológicos, narrativas autocentradas e uma visão distorcida disseminada por meios de comunicação e instituições. Há décadas profetiza-se seu colapso, ridicularizam-se seus avanços, mal se compreende sua cultura política e ignora-se sua visão estratégica.
Adrián Díaz Marro, com mais de vinte anos de vivência profissional na China profunda, sustenta que essa ignorância não é acidental: trata-se de uma forma de autoproteção cultural que impede entender a real magnitude da transformação em curso.
Sua visão rompe com os binarismos clássicos: a China não é nem uma ameaça nem uma utopia, nem comunismo tradicional nem cópia do Ocidente.
É outra civilização.
2. Conquistas incontestáveis
A China passou de país mais pobre do mundo em 1960 (mais pobre que a África Subsaariana) a retirar 100% de sua população da pobreza em apenas 40 anos.
Superou o Ocidente como líder industrial, tecnológico e comercial em diversos setores: mobilidade elétrica, baterias, drones, telecomunicações, inteligência artificial, construção civil e energia solar.
Seu modelo não depende da democracia liberal nem do capitalismo clássico, mas sim de uma combinação funcional de planejamento estratégico, empreendedorismo competitivo e uma ordem sociopolítica baseada em valores históricos e pragmáticos.
3. Pilares do seu modelo
– A. O “Confucionismo Operacional”
Como aponta Iván Gatón, mais do que um sistema comunista, a China opera sob uma lógica confucionista de hierarquia harmoniosa, dever social, valorização da educação, mérito e estabilidade.
A política não é concebida como uma disputa de poder, mas como um instrumento de ordem moral e coletiva.
– B. Meritocracia efetiva
A liderança política na China não se constrói por campanhas midiáticas ou redes clientelistas, mas sim por meio de uma rigorosa ascensão baseada no mérito administrativo.
A visão ocidental de que “lá não há democracia” impede de enxergar que há mais meritocracia real do que em muitas democracias liberais.
– C. Planejamento estratégico adaptativo
Os famosos “planos quinquenais” não são imposições verticais, mas sim molduras que consolidam avanços já emergentes nas bases.
Exemplo: a transição para os carros elétricos não foi decretada pelo Estado, e sim incentivada quando já era uma realidade crescente nas cidades.
– D. Pragmatismo comercial
A China não busca impor ideologias.
Não exige conversão cultural.
Seu foco é o comércio, o desenvolvimento mútuo e a estabilidade.
Tem demonstrado capacidade de negociar inclusive com governos que a atacaram retoricamente, como no caso da Argentina sob Milei.
4. Erros recorrentes do Ocidente
Projetamos nossos medos sobre a China: presumimos que, se eles crescerem, farão o que nós faríamos — invadir, dominar, impor.
Mas a civilização chinesa não atua a partir da emoção expansionista.
Não busca revanche, e sim respeito e equilíbrio.
Medimos seu sucesso com nossas próprias categorias: dizemos que “não têm democracia” e, portanto, “não podem ser felizes”.
No entanto, diversas pesquisas apontam mais de 80% de aprovação ao governo de Xi Jinping e grande confiança no sistema.
Ignoramos deliberadamente suas conquistas: enquanto nos obcecamos por possíveis colapsos, a China lidera setores estratégicos do século XXI sem seguir nossos modelos.
5. Perspectivas estratégicas
A China não será “o próximo Estados Unidos”.
Não exportará seu modelo como ideologia.
Mas alterará para sempre os equilíbrios globais.
Sua ascensão não é linear nem definitiva, mas seu papel já é estrutural. Para a América Latina — e especialmente para o Uruguai:
Viver de costas para a China é uma decisão temerária. A ignorância estratégica nos mantém presos a esquemas ultrapassados.
É necessário estudar sua lógica institucional, suas plataformas tecnológicas, suas rotas comerciais e suas prioridades internas.
Mais do que imitar, precisamos compreender — e, a partir desse entendimento, traçar caminhos de cooperação inteligente.
6. Conclusão
A China não é uma ameaça; é um espelho.
Diante de sua ascensão, há dois caminhos: a negação autocomplacente ou o estudo corajoso.
Como diz Díaz Marro: “Não vão evangelizar os nativos. Vão para aprender.”
Relatório estratégico por: Tacitus Australis – Julho de 2025
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